livre-arbítrio

O nosso juízo sobre os outros pode estar certo ou errado, mas é nosso dever e até obrigação não abdicar do juízo baseado em valores. S. Tomás de Aquino coloca o problema da seguinte maneira :

  • o ser humano tende necessariamente para o seu fim; como todos os seres vivos, tem um arbítrio: move-se por si mesmo e escolhe certos actos entre outros; mas, diferentemente dos outros seres vivos, o Homem é capaz de se representar o objecto do seu desejo na ausência deste, porque pode tornar, ou não, presente um objecto como desejável — e por isso, o arbítrio do Homem é livre1;
  • a contingência da escolha releva dos juízos racionais que propõem a alternativa dos actos possíveis. Mas, a partir do momento em que o Bem se apresenta ao intelecto, este deseja-o naturalmente — mesmo se mantém a capacidade de se abster! A falta consiste em querer um bem particular que não é o bem devido, e explica-se pela mediação do intelecto: este pode apresentar ao desejo um objecto menos perfeito do que o Bem, e arrastar então o homem para uma escolha desviante (para uma falta). A raiz do pecado reside no intelecto, e a liberdade humana consiste em querer o que é racional (o que corresponde a uma ordem cósmica!) — quando o intelecto apresenta ao apetite o Bem verdadeiro e não um bem aparente;
  • a lei (ética) é uma “ordenação da razão” que tem “em vista o bem comum” para “aquele que tem o encargo de velar pela comunidade”, e “exige promulgação”3. De Deus ao mais humilde homem, passando pelo príncipe, escalona-se toda uma hierarquia de legisladores: cada homem é livre, dotado de uma razão autónoma e legisladora, mas submetida à razão do Legislador Supremo — uma vez que toda a lei exprime a razão divina!;
  • a lei manifesta-se em três graus: a lei divina, que é sabedoria eterna de Deus; a lei natural, que é a tradução da lei divina na ordem natural; e a lei humana, que é a sua formulação positiva e particular. Neste edifício insere-se a doutrina da virtude: um acto é moralmente bom quando é virtuoso: o vício é contra a natureza. Ora, como o ser humano é racional, o bem moral é aquilo que está de acordo com a razão4: como em Aristóteles, S. Tomás de Aquino demonstra que a virtude consiste em ordenar as nossas paixões segundo a razão, e não em suprimi-las (como defendeu o estoicismo).

Sobre o “juízo moral” dos outros e de si mesmo, S. Tomás de Aquino diz o seguinte:

  • cada ser humano está condicionado pelo seu próprio intelecto. Neste contexto, um acto apenas é moral se se conforma com o ditame da consciência. O acto cometido por uma consciência errónea continua a ser mau em si mesmo e distinto daquele que obrigaria uma consciência bem informada. E obedecer à sua consciência nada retira à falta prévia de não ter informado a sua consciência: se apenas podemos obedecer à nossa má natureza, temos o dever de a substituir por uma melhor sempre que pudermos.

Isto significa o seguinte: mesmo que eu esteja errado acerca de um juízo sobre a conduta de outrem, é sempre melhor eu ter um juízo errado mas conforme à minha consciência mesmo que errónea, do que não ter nenhum juízo. Se eu estiver errado acerca do meu juízo sobre outrem, então é meu dever informar melhor a minha consciência — porque um acto apenas é moral se se conforma com o ditame da consciência.


Editado por (OBraga)

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